Há cem anos que a Agricultura tem um Ministério próprio
Foi no governo de Sidónio Pais que a Agricultura teve direito a ministério. A I Guerra Mundial foi determinante para se dar este passo.
Por Leonardo Aboim Pires *
A criação de um ministério obedece ao entendimento que um determinado governo tem sobre alguma área específica da vida de um país, quer seja na procura de respostas e soluções em tempos de crise, quer seja na construção de um caminho de reforma e mudança.
A criação do Ministério da Agricultura, que este ano comemora 100 anos de existência, é o resultado de anos de debate e reivindicações, sobretudo por parte das elites ligadas à exploração da terra, ao longo da segunda metade do século XIX.
No tempo da Primeira República, Portugal era, do ponto de vista económico, um país agrícola, em que 57,4% da população ativa se encontrava ligada à agricultura. Em termos da propriedade, a sua repartição encontrava-se feita da seguinte forma: a Norte estava muito dividida, através dos minifúndios, ao contrário do Sul, onde predominava o latifúndio.
Esta desproporção traduzia-se num reduzido desempenho económico, sendo vários os autores da época que alertavam para a decadência e a crise em que a agricultura portuguesa se encontrava. Uma das soluções apresentadas seria a autonomia de um departamento governamental apenas dedicada aos problemas da terra portuguesa.
Apanha da azeitona no Alentejo. Foto: Artur Pastor/Arquivo Municipal de Lisboa.
O primeiro projeto que previa a criação de um só ministério para as questões agrárias foi apresentado na Câmara dos Deputados em 1908 por Manuel Moreira Júnior, a que se seguiu outro, proposto por D. Luís de Castro, em 1909.
Com a implantação da República, em 1910, a resolução das questões económicas encontra-se circunscrita ao Ministério do Fomento, no qual se encontrava a Direcção-Geral de Agricultura que, em 1917, passaria para o Ministério do Trabalho.
Com o decorrer da Primeira Guerra Mundial (1914-18) e as complexidades surgidas nesse contexto houve necessidade de um Estado mais interventivo, de modo a corresponder aos vários problemas que percorriam a sociedade portuguesa da época. Uma das maiores dificuldades foi o regular fornecimento de alimentos, a chamada “questão das subsistências”.
De forma a poder contornar o problema, seria necessário a intensificação da produção agrícola. Teria que existir um órgão que pudesse controlar e promover um melhor aproveitamento da agricultura. Urgia assim a transferência de competências da Direcção-Geral de Agricultura para um Ministério.
A oportunidade surgiu com o governo de Sidónio Pais, cuja chegada ao poder foi muito apoiada pelos interesses agrários. De modo a mostrar a sua proteção ao sector primário, a 9 de Março de 1918, com a promulgação do decreto nº 3902, foi criado o Ministério da Agricultura, sendo o seu primeiro titular o médico e proprietário agrícola Eduardo Fernandes de Oliveira.
Estrutura do Ministério da Agricultura em 1918, in http://www.ruralportugal.ics.ul.pt.
Já o decreto nº 4249, de 8 de Maio do mesmo ano, lançou os principais objetivos deste novo órgão, nos quais se encontrava o aumento da produção agrícola, o ensino da agricultura e o estudo das condições naturais das diversas regiões.
Para isso foram criadas nove direções, incumbidas de levar a cabo estes enunciados. Entre as medidas mais significativas tomadas pelo Ministério contam-se prémios para o aumento da produção, concessão de crédito aos proprietários, aumento dos preços agrícolas e facilidades para a concentração de propriedades, além dos primeiros ensaios de motomecanização.
Em 1932, o Ministério da Agricultura deixa de ser autónomo para se converter no Ministério do Comércio, Indústria e Agricultura. Já em 1940, passa a ser uma Subsecretaria de Estado, dependente do Ministro da Economia. Apenas em 1975, já no regime democrático, volta a ser Ministério.
Em síntese, a criação deste Ministério revelou-se como o fim de um longo caminho reivindicativo para os problemas de um sector que, até aos dias de hoje, se revela importante para parte da população portuguesa.
(*) Este artigo foi escrito no âmbito da parceria entre o Laboratório de História do Instituto de História Contemporânea (IHC), da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, da Universidade Nova de Lisboa – e o Jornalíssimo, com coordenação de Ana Paula Pires, Luísa Metelo Seixas, Ricardo Castro e Susana Domingues.