O Afeganistão um ano depois da retirada norte-americana
O regresso dos taliban tem sido sinónimo de violações contínuas dos Direitos Humanos.
A história do Afeganistão é muito longa, mas o último capítulo não pode contar-se sem regressar a setembro de 2001 e ao ataque do grupo terrorista Al Qaeda às Torres Gémeas de Nova Iorque. Foi a 11 de setembro. Quatro aviões sequestrados embateram contra os dois arranha-céus e um edifício em Washington, matando 3000 pessoas.
A ocupação começa
Exatamente sete dias depois desse ataque terrorista, levado a cabo pela Al Qaeda, a 18 de setembro de 2001, a Câmara de Representantes e o Senado norte-americano autorizaram que os Estados Unidos entrassem em guerra com o Afeganistão, onde se supunha estar escondido o líder daquela organização terrorista, Osama Bin Laden, apoiado pelo regime taliban.
Só houve um voto contra. O bombardeamento daquele país do centro da Ásia começou poucas semanas depois.
Em dezembro desse mesmo ano, os taliban renderam-se. De 2001 a 2021, os Estados Unidos e os seus aliados, europeus e canadianos, ocuparam o Afeganistão (Portugal enviou ao todo 4500 militares para aquele país). Mas isso não significou o desaparecimento dos taliban.
O anúncio da retirada e o regresso dos taliban
Em abril de 2021, o presidente dos E.U.A., Joe Biden anunciou a retirada das forças americanas do Afeganistão. Entre as razões evocadas por Biden estava a ideia de que o governo afegão, que os E.U.A. ajudaram a subir ao poder depois da saída dos taliban, organizando eleições livres, não tinha capacidade para assumir os destinos do país e os Estados Unidos não podiam continuar ali eternamente, tanto mais que a opinião pública americana se mostrava cada vez mais contrária à ocupação.
Os taliban aproveitaram a oportunidade. Depois de anos escondidos nas montanhas, tirando partido da geografia acidentada do Afeganistão, eles que já vinham conseguindo antes de agosto de 2021 assumir o controlo de várias regiões afegãs, conseguiram conquistar a capital, Cabul, e tomar de assalto o Palácio Presidencial. O governo, como se imaginava, não conseguiu resistir.
As promessas…
Depois da tomada de Cabul, os taliban comprometeram-se, numa conferência de imprensa, a respeitar os direitos das mulheres, deixando que continuassem a trabalhar e garantindo que as crianças do sexo feminino poderiam continuar a ir à escola.
Os afegãos e a comunidade internacional desconfiaram das promessas dos talibans, um grupo radical, que quando esteve no poder (a primeira vez foi em 1996) impôs um regime obscurantista e radical, baseado na sua interpretação extrema da lei islâmica.
Os receios confirmam-se
Um ano depois de 31 de agosto de 2021, o dia em que o último soldado norte-americano deixou o Afeganistão, os piores receios confirmaram-se.
As promessas dos taliban não passaram disso mesmo e os cidadãos – sobretudo, as cidadãs do país – vivem, de há um ano a esta parte, num clima de opressão e terror. Clima esse que muitos e muitas afegãos e afegãs não conheciam.
Como lembra Neta C. Crawford num artigo publicado no The Conversation, a idade média da população do Afeganistão situa-se apenas nos 18,4 anos. Ou seja, a maioria nasceu já num país ocupado por forças internacionais que lhe permitiu viver uma vida mais próxima à dos países ocidentais. As mulheres trabalharam em todos os setores, as crianças e jovens do sexo feminino puderam ir para a escola e para a universidade.
Há um ano, quem não pôde deixar o Afeganistão e encontrar refúgio noutro país, viu assim a sua vida mudar de forma radical.
A opressão do sexo feminino
As mulheres – independentemente da idade – perderam muitas das suas liberdades. As que trabalhavam deixaram de poder trabalhar em qualquer setor, podendo apenas ter empregos que os taliban permitem e que se reduzem quase sempre a limpezas. Não podem andar na rua sem estarem com o rosto coberto por uma burca, só podem viajar na companhia de um familiar. As meninas deixaram de poder frequentar a escola a partir do 6º ano. Independentemente do sexo, os taliban maltratam quem se opõe ao seu regime, reprimindo qualquer tipo de protestos.
Num relatório divulgado há poucos dias, a Amnistia Internacional denuncia contínuas violações dos Direitos Humanos no país.
Tudo é agravado pela situação económica do Afeganistão, que é muito desfavorável. O jornal Público cita dados da organização não-governamental Save the Children, segundo a qual 97% das famílias afegãs enfrenta hoje dificuldades para dar de comer aos filhos e 80% das crianças dizem ter ido para a cama com fome.
Perante esta situação dramática, são várias as organizações internacionais que pedem mudanças urgentes no Afeganistão.
Foto: Pxhere