Mais alegados casos de plágio vêm à tona após denúncia de leitora do Público

Nas redes sociais (mas não só), mais pessoas têm vindo a divulgar alegados casos de plágio envolvendo jornais e jornalistas portugueses.

Por Joana Fillol

O Conselho Deontológico (CD) do Sindicato dos Jornalistas, na resposta às perguntas que lhe foram enviadas pelo Jornalíssimo – a propósito do caso que começou com a denúncia, por uma leitora (*), de uma situação de plágio no jornal Público – dá a entender que uma das razões que o levou a não tomar uma manifestação pública sobre este caso foi o considerar tratar-se de “um caso isolado (relativamente ao jornalismo português em geral)”. Sabe mais sobre a resposta do CD neste artigo.

No dia em que o CD responde ao Jornalíssimo (quarta, 12 de outubro) já era público que, pelo menos, o caso que motivou a denúncia não era isolado, no sentido em que já eram conhecidos outros eventuais plágios cometidos por Vítor Belanciano (VB) nas páginas do jornal Público.

Quando tornou o assunto público no seu mural de Facebook, a leitora que fez a denúncia explicava já que, o plágio de VB que havia denunciado era, pelo menos, já o segundo feito pelo mesmo jornalista nas páginas daquela publicação diária. Tinham-lhe enviado, entretanto, um link para um artigo de 2009, assinado por Joaquim Vieira (provedor do leitor do jornal Público à época), em que respondia a uma queixa do jornalista e escritor Hugo Gonçalves, que afirmava ter visto partes inteiras de um texto seu serem apropriadas por VB no Público. O título do artigo de Joaquim Vieira era “Esse espectro chamado plágio“.

Mais casos conhecidos envolvendo VB

A 8 de outubro, Dora Santos Silva, investigadora na área dos media e do jornalismo e professora na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (por vezes, escreve artigos de opinião no jornal Público), publicou na sua página de Facebook um texto onde dava conta de mais dois artigos de VB publicados no Público, onde este se apropriava de textos de outros autores.

Dora Santos Silva apresentava o caso de duas crónicas de VB, com os títulos “Nova normalidade ou negação da realidade” (publicado a 28 de junho de 2020 no jornal Público) e “O fim da utopia digital” (publicado no mesmo jornal a 28 de novembro de 2021). Na seu post, a professora universitária apresenta excertos que comprovam o que afirma e identifica quem são os autores plagiados por VB naqueles artigos. No primeiro, de2020, Dora Santos Silva identifica ideias e frases do escritor espanhol Julio Llamazares; no segundo, de 2021, as declarações indevidamente usadas pertencem, nota a professora da Universidade Nova de Lisboa, a três autores diferentes: a César Rendueles e à jornalista que o entrevistou, Berna Harbour, e, ainda, a Douglas Rushkoff.

Dias depois, também no Facebook, Luísa Semêdo, professora de Filosofia do Ensino Secundário e cronista do jornal Público, para o qual escreve artigos de opinião periodicamente, transmitia aos seus seguidores que VB se havia “reapropriado” de um texto que ela, Luísa Semêdo, publicara no Facebook para uma das suas (de VB) crónicas.

Denúncias de plágio feitas por jornalistas em mais do que um jornal

A prática de plágio no jornalismo português não parece ser um “caso isolado” na prática profissional do jornalista em questão, mas também não parece ser um “caso isolado” no sentido de acontecer num só jornal.

A jornalista Sílvia Caneco serviu-se nos últimos dias também da rede social Facebook para revelar a 15 de outubro (ou seja, já depois de o CD nos ter enviado as suas respostas) que, em 2015, “no espaço de um mês”, foi vítima de dois plágios. Num dos casos, refere que 12 parágrafos da sua autoria foram “copiados integralmente” por outro colega de profissão.

Sílvia Caneco explica ainda que, em ambos os casos, denunciou “as más práticas às respetivas direções”. Sendo que, num deles – segundo ainda Sílvia Caneco – lhe foi comunicada “a abertura de um processo disciplinar contra a autora [do plágio]. No final, nada aconteceu. Continua por aí a ser ‘jornalista’” [as aspas na palavra ‘jornalista’ são da própria Sílvia Caneco no seu post].

Relativamente ao segundo caso de que foi alvo, Sílvia Caneco diz ter recebido um telefonema do diretor “praticamente a implorar para que eu não apresentasse queixa, porque sabia que eu tinha vários amigos naquela publicação e ‘decerto não ia querer prejudica-los’” [De novo, as aspas são de Sílvia Caneco].

A jornalista – que não revela nem o nome dos jornais nem dos jornalistas de que afirma ter sido vítima – escreve, ainda, sobre este segundo caso, que o mesmo diretor lhe disse: “’Ele está a prazo e nós aprendemos a lição e agiremos em conformidade’ [aspas no original]”. Prossegue Sílvia Caneco: “Sabem o que aconteceu? Nada. Quanto muito, promoveram-no. Acresce que no final do texto introduziram uma nota como se o problema tivesse sido uma falta de citação. Não era, era uma cópia integral”, escreve.

Em seguida mostra-se, de certo modo, arrependida por não ter apresentado queixa, ao dizer: “estupidamente, não apresentei todas as queixas que devia ter apresentado contra uma prática que abomino e que é tão, mas tão desvalorizada entre jornalistas”. Caneco refere também que, até ao dia de hoje (passados sete anos), nenhum dos dois autores que a plagiaram lhe endereçaram um pedido de desculpa.

A denúncia de um leitor da revista Visão História

Um leitor atento da Visão História fez-nos, também, chegar uma nota que a revista escreveu na página 3 da sua edição nº 65, de junho de 2021, em que, por baixo da palavra “Correção” escrita a bold, deixava a seguinte nota: “Por lapso, no último número da VISÃO História (nº 64), dedicado aos 125 anos do cinema em Portugal, não foi referida a fonte de informação em que se baseou o artigo ‘Fitas de Papel’, sobre as revistas cinematográficas: a investigação de Joana Isabel Duarte, bolseira da FCT e investigadora integrada do CIT-CEM-Faculdade de Letras da Universidade do Porto e autora de um artigo publicado na revista Património a Norte [título em itálico no original]. À investigadora, e aos leitores, as nossas sinceras desculpas.”

O artigo de Joana Isabel Duarte está acessível online, neste link, mas o Jornalíssimo ainda não conseguiu ter acesso ao número 64 da revista Visão História para poder fazer uma comparação entre os dois textos em questão. Em causa estará não a transcrição de frases do artigo original, sem citação da autora, mas a apropriação do trabalho de investigação realizado por Joana Isabel Duarte pelo jornalista, dando a quem lia a ideia que o trabalho tinha sido resultado do esforço do jornalista e não da investigadora, cujo nome não era sequer mencionado no artigo.

Foto: pxhere

(*) Esse plágio foi denunciado pela leitora Joana Fillol, que é também a diretora e única jornalista do jornal digital para crianças e jovens, Jornalíssimo. Por ter estado diretamente envolvida no episódio, uma vez que foi ela quem denunciou o caso e insistiu com o jornal Público para que este tomasse as medidas que o Código Deontológico do Jornalista e o próprio Livro de Estilo preveem, tentou que outros jornalistas e redações nacionais do país pegassem na história que, a seu ver, tinha valor-notícia, ou seja, deveria ser noticiado, por se tratar de uma questão relacionada com a liberdade de imprensa e com os códigos de ética e deontologia que regem o jornalismo. Vendo que todas as redações e os jornalistas que contactou não manifestaram interesse em noticiar o caso, e por ela considerar que este tema é de interesse público, decidiu que seguiria a sua missão como jornalista, contando o que se estava a passar no jornal que fundou em 2015. Deu logo conta desta situação aos leitores no primeiro artigo que escreveu sobre este caso, a 4 de outubro de 2022: Redações calam escândalo no jornalismo português.

Notícia atualizada a 17 de outubro de 2022, com o acrescento da útima frase do artigo: “Em causa estará (…)”

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