Os taliban retomaram o poder no Afeganistão | Foto: ISAF Public Affairs/Wikimedia Commons

Quem são os taliban e o que têm eles a ver com grupos terroristas?

Conhece a história deste grupo que assumiu o controlo e semeou o caos no Afeganistão.

O termo taliban vem de ‘talib’ que significa ‘estudante’ em pastho, uma das duas línguas mais faladas no Afeganistão (a outra chama-se dari).

A origem deste grupo só pode ser compreendida recordando um pouco da história recente do Afeganistão, um país asiático que faz fronteira com seis países: Paquistão, Irão, Turquemenistão, Uzbequistão, Tajiquistão e China.

Na mira dos Estados Unidos e da União Soviética

Na década de 70 do século passado, o Afeganistão foi disputado pelas duas grandes potências mundiais da época: os Estados Unidos da América, por um lado, e a União Soviética, por outro. Ambas queriam ver aquele país asiático governado por forças com uma ideologia próxima da sua.

A União Soviética levou a melhor. Em 1978, um grupo comunista assumiu o poder, mas, ao rejeitar a principal religião do país – o Islamismo – provocou um grande descontentamento e revolta por parte da população.

Os Estados Unidos da América ajudaram então a armar vários grupos de rebeldes no Afeganistão com o objetivo de derrubar os comunistas no poder. Mas a União Soviética não ficou parada. Em 1979 invadiu o país numa tentativa de segurar o governo comunista.

O resultado foi uma guerra que se prolongou durante uma década. Em 1989, a União Soviética caiu, o seu exército retirou-se e três anos mais tarde, em 1993, o grupo comunista sucumbiu aos ataques dos rebeldes.

Uma leitura radical do Corão

O Afeganistão, porém, permaneceu profundamente dividido. Os próprios rebeldes que tomaram o poder tinham projetos muitos díspares para o país. Os combates e os conflitos continuaram, assim, a fazer parte do dia-a-dia do povo afegão, agora a viver uma guerra civil.

E é aqui que entram os taliban. Em 1996, o grupo de estudantes subiu ao poder, com promessas de levar a paz ao país e de defender o Islamismo, condenado pelo anterior governo comunista.

As promessas de paz, porém, escondiam uma leitura radical do Corão (ou Alcorão), o livro sagrado dos muçulmanos. Uma vez no poder, os taliban revelaram-se um grupo extremista, impondo leis obscurantistas à população e, em especial, às mulheres.

Para teres uma ideia, nos anos em que os taliban estiveram à frente do Afeganistão, entre 1996 e 2001, as meninas com mais de dez anos não podiam frequentar a escola e as mulheres só podiam circular na rua com o corpo coberto da cabeça aos pés, com uma burca. Televisão, música e cinema passaram a estar proibidos e qualquer desobediência às regras impostas pelos taliban era paga com punições de extrema violência. No Afeganistão dos taliban, os Direitos Humanos eram uma miragem.

2001: o ano da invasão dos Estados Unidos

O poder dos taliban no Afeganistão chegou ao fim em 2001, por causa de um episódio marcante na história mundial que teve lugar nesse ano: os ataques terroristas do dia 11 de setembro nos Estados Unidos da América. Nesse dia, quatro aviões foram sequestrados e embateram contra dois arranha-céus em Nova Iorque e um edifício em Washington, tirando a vida a quase 3000 pessoas.

Por detrás desse ataque estava um grupo terrorista, a Al-Qaeda, liderada por Osama Bin Laden. Os Estados Unidos prometeram vingar o ataque. Acreditavam que Bin Laden estaria escondido no Afeganistão com a cumplicidade do governo taliban. Apesar da pressão, os taliban não cederam e não revelaram o paradeiro do que passou a ser o homem mais procurado do mundo.

A retaliação foi a invasão do Afeganistão pelos Estados Unidos e os seus aliados, europeus e canadianos. Milhares de tropas estrangeiras ocuparam o país ainda nesse ano de 2001, afastando os talibans do poder e ajudando a estabelecer um novo governo, capaz de garantir alguma estabilidade e paz no país. Portugal participou também nesta operação – desde 2002, mais de 4500 militares portugueses se juntaram a esta missão no Afeganistão.

Uma frágil normalidade

Apesar da ocupação norte-americana de 2001 ter conseguido afastar os taliban do poder ao longo destes vinte anos – de 2001 a 2021, período em que as tropas estrangeiras permaneceram no Afeganistão -, muitos problemas ficaram por resolver no país.

Com inúmeras montanhas, entre as quais a cordilheira Hindu Kush, o Afeganistão é um território difícil de conquistar. E de vigiar. Os taliban souberam tirar partido dessa geografia difícil para a sua resistência. Foram forçados a deixar o poder, mas nunca desapareceram, estando apenas à espera da melhor oportunidade para voltar.

Essa oportunidade foi anunciada em abril deste ano, quando o presidente norte-americano Joe Biden anunciou que as forças americanas deixariam o país até setembro. O governo afegão, como se adivinhava, não era forte o suficiente para resistir à partida dos militares estrangeiros. Não dispunha sequer de um exército capaz de combater os radicais islâmicos que estavam à espreita.

Na verdade, o antigo presidente norte-americano, Donald Trump, tinha já assinado um acordo com os taliban em 2020. As tropas americanas saíam e, em troca, os taliban prometiam não atacar os Estados Unidos e, também, negociar acordos de paz com o governo afegão. Mas esse acordo falhou e os taliban não pararam de tentar conquistar território desde então.

O temido regresso dos taliban

O que se receava aconteceu: no passado dia 15 de agosto, os taliban – que já tinham, ao longo dos últimos meses, vindo a assumir o controlo de várias regiões do Afeganistão – conseguiram conquistar a capital, Cabul, e tomar de assalto o Palácio Presidencial.

Pouco depois, o porta-voz dos taliban garantia, numa conferência de imprensa, que o novo governo iria respeitar os direitos das mulheres e perdoar a todos aqueles que tinham lutado contra eles nos vinte anos de ocupação. Nessa ocasião, os talibans disseram estar dispostos a deixar que as mulheres trabalhassem e as crianças do sexo feminino fossem à escola, ainda que dentro de alguns limites, que não foram esclarecidos.

Os afegãos e a comunidade internacional estão, no entanto, muito céticos em relação a esta abertura dos taliban. Muitas pessoas não confiam no que foi dito e, receando voltar a viver sob um regime obscurantista e radical, foram milhares aqueles que tentaram abandonar o país, concentrando-se no aeroporto da capital.

Um futuro incerto e o terrorismo à espreita

As últimas notícias que chegam do Afeganistão fazem antever tudo menos um futuro próximo sorridente para o país. Passaram poucos dias desde que os taliban voltaram ao poder e os grupos terroristas já atacaram no país.

O Estado Islâmico Khorassan (um ramo do autoproclamado Estado Islâmico ou Daesh) já reivindicou os ataques à bomba que ocorreram nos arredores de Cabul e mataram 90 pessoas.

Sendo aquele que representa maior perigo, este não é este o único grupo terrorista que preocupa a comunidade internacional. As atenções estão também voltadas para a Al-Qaeda. Teme-se que a chegada dos taliban ao poder crie um terreno fértil para que tanto o Daesh como a Al-Qaeda se reforcem – os dois grupos terroristas têm vindo a ser combatidos e encontram-se atualmente fragilizados. Uma das preocupações é que alguns taliban que discordaram que o grupo tentasse sequer negociar um acordo com os Estados Unidos, possam deixar os taliban e engrossar as fileiras da Al-Qaeda ou do Daesh.

Fora a certeza de que o Afeganistão é, neste momento, um país mergulhado no caos e que os meses que se aproximam serão difíceis, tudo o resto parece ser um enorme ponto de interrogação. Nos próximos tempos, a comunidade internacional estará de olhos postos neste pedaço do mundo, onde vivem mais de quarenta mil pessoas numa área que é sete vezes maior do que a de Portugal. 31 de agosto de 2021 fica para a história como o dia em que o último soldado norte-americano deixou o Afeganistão, depois de uma ocupação que se prolongou por vinte anos.

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