A Guerra condicionou mas não parou o desporto e a imprensa desportiva
Durante a Grande Guerra, os jornais desportivos portugueses continuaram a incentivar o exercício físico e o desporto fazia parte da vida dos soldados.
Rita Nunes – IHC-FCSH-UNL / Comité Olímpico de Portugal (*)
O processo de organização e desenvolvimento do desporto em Portugal, à semelhança do que aconteceu noutros países, foi condicionado pela eclosão da Grande Guerra.
A imprensa desportiva, que em parte tinha ajudado ao desenvolvimento e divulgação das atividades físicas e do desporto, continuava a incentivar a prática desportiva. Com o argumento de que a qualquer momento o País seria chamado a intervir, defendia a introdução da educação física e de alguns desportos na preparação militar dos soldados, afirmando que um jovem bem preparado fisicamente seria um bom soldado e um melhor cidadão.
De Lisboa partiriam a 11 de Setembro de 1914 as primeiras expedições militares portuguesas com destino a Angola e a Moçambique. Apesar do clima quente e seco, as tropas foram incentivadas à prática desportiva. No entanto, fisicamente exaustos, foram poucos os soldados a dedicar-se ao exercício físico. Os banhos de mar eram bastante apreciados, assim como os jogos de cartas, mas estes por serem considerados causadores de tensões e rivalidades acabaram por ser proibidos. Entre os oficiais as corridas de cavalos eram as favoritas, juntamente com os jogos de cartas e de tabuleiro.
A 9 de Março de 1916, com a declaração de guerra da Alemanha a Portugal, deu-se a mobilização do desporto nacional. O primeiro contingente do Corpo Expedicionário Português (C.E.P.), partiu de Lisboa a 26 de Janeiro de 1917 com destino à Flandres e nele foram integrados alguns atletas portugueses, como o então campeão de pesos e alteres, Álvaro Costa, e o atirador António Augusto Martins (que viria a participar nos Jogos Olímpicos em 1920 e 1924).
A prática desportiva fez parte do quotidiano do C.E.P. durante a sua permanência em França. As atividades desportivas eram organizadas entre os militares dos exércitos aliados ou entre as tropas do C.E.P.
Para além de alguns jogos de futebol e provas de atletismo, os concursos militares e desportivos tinham grande destaque. Nestes concursos era possível encontrar uma parte predominantemente militar e outra de carácter desportivo como as corridas de resistência e velocidade, os saltos em extensão e altura, o lançamento do peso, do disco e… o lançamento de granadas!
Estes eram essencialmente momentos de descontração, indispensáveis à boa moral dos militares e ao êxito das operações, onde sargentos, cabos e soldados exaltavam as suas capacidades físicas, dando o seu melhor para ver o seu batalhão vencer.
Interessante é também verificar que o único cartaz de propaganda de guerra de autoria nacional mostre não só a guerra mas também o desporto. A figura central é um jogador de futebol rodeado por dois regimentos de tropas.
Também a imprensa desportiva acompanhou esta guerra a par e passo. Vejamos o exemplo do jornal ‘O Sport de Lisboa’ que, a 15 de Agosto de 1914, noticiava o início da guerra na Europa e o envolvimento de vários atletas, alguns deles as grandes figuras desportivas da época, e, na sua edição de 14 de Setembro de 1918, iniciou uma subscrição nacional para enviar artigos desportivos aos prisioneiros portugueses na Alemanha, para que estes pudessem praticar alguns desportos nos campos onde se encontravam.
Após a assinatura do Armistício a 11 de Novembro de 1918 o principal objectivo dos soldados mobilizados era o regresso a casa. A desmobilização das tropas prolongou-se e foi a pensar nestes homens que ainda se encontravam na Europa que, dois meses após o final da Grande Guerra, se iniciou a organização dos Jogos Interaliados.
FOTOS: 1 a 3 – Portugal na Guerra: Revista Quinzenal Ilustrada – 1) 15 de setembro de 1917, 2) 10 de julho de 1917, 3) 11 de janeiro de 1917; 4 – único exemplar conhecido de cartaz português na I Guerra Mundial
(*) Publicada ao dia 30 de cada mês, a rubrica “História, Desporto e Olimpismo” é dedicada ao estudo das origens e evolução do desporto e do Movimento Olímpico em Portugal . Resulta de uma parceria entre o Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa (IHC – UNL) e o Jornalíssimo e tem a coordenação científica de Rita Nunes, Directora do Gabinete de Estudos e Projectos do Comité Olímpico de Portugal e investigadora do IHC.