com apenas 14 anos, Forjaz de Sampaio matriculou-se no curso de Leis

O homem que introduziu a economia na Faculdade de Direito de Coimbra

Se te interessas por direito, economia ou estatística, tens de conhecer este nome: Forjaz de Sampaio

Por Alcino Pedrosa*
A obra de Adrião Pereira Forjaz de Sampaio constitui uma referência obrigatória para quem se interessa pela história do pensamento económico português. Este lente (professor universitário) coimbrão foi responsável por instituir o ensino da economia na Faculdade de Direito de Coimbra, de onde saía a maior parte dos quadros do aparelho administrativo. Durante quase meio século, os manuais que se usaram para a didática desta disciplina foram os seus.

Forjaz de Sampaio nasceu em Coimbra em 1810. O pai, Juiz de Fora, desde cedo incentivou no filho a paixão pelo direito. A educação cuidada e enriquecedora que lhe terá proporcionado – escrevem os seus biógrafos – determinou que aos 13 anos o jovem Forjaz já estivesse habilitado para todos os exames preparatórios necessários para ingressar em estudos superiores (1).

De facto, com apenas 14 anos, Forjaz de Sampaio matriculou-se no curso de Leis. O percurso enquanto aluno pode considerar-se excelente. Nos cinco anos do curso, foi sempre aprovado por unanimidade, obtendo informações finais bastante favoráveis.

Concluído o curso, o jovem Forjaz de Sampaio desempenhou o cargo de secretário do governador militar de Coimbra. Mas em 1836 regressava à Universidade de Coimbra: foi-lhe entregue a regência da cadeira de economia política (2), à qual viria a estar associado por um período de 38 anos.

A maturação do pensamento de Forjaz Sampaio

Durante o período em que foi professor universitário, Forjaz de Sampaio assumiu-se como uma espécie de anjo tutelar do ensino superior de economia política, em Coimbra. Revelou-se um escritor prolixo, tendo publicado sete edições do seu manual, para além de um conjunto significativo de estudos e artigos dedicados a esta ciência, onde eram visíveis, não só as suas preocupações pedagógicas, como também o desiderato em aprofundar os seus conhecimentos.

As edições que lançou do seu manual mostram a maturação do pensamento de Forjaz de Sampaio. Começou por utilizar o Catecismo de Economia Política, de Jean-Baptiste Say. A segunda edição do seu manual faria já uma utilização exaustiva do tratado de Karl Heinrich Rau (3). Numa fase posterior, o autor fixou-se nas obras de economistas (como Bastiat, Rossi, Dunoyer e Chevalier), que se situavam na esfera ideológica e doutrinal do editor francês Guillaumin, cujo Dictionnaire de l’ Économie Politique era justamente considerado pelo professor coimbrão como sendo o mais importante texto económico dos últimos tempos. As sexta e sétima edições do manual (1867 e 1874) representam uma afirmação de autoridade da sua parte, já que, em alguns momentos, consegue libertar-se dos condicionalismos impostos pela Universidade para abordar matérias que iam muito para além do programa.

Digitalização da capa da Coleção Obras Clássicas do Pensamento Económico Português, dirigida por Alcino Pedrosa. Lisboa, Banco de Portugal.

A edição de 1874 dos Elementos de Economia Política e Estadística (4) deixa perceber uma obra projetada à margem das ideologias doutrinárias dominantes, mas também com um grande sentido doutrinário de equilíbrio entre noções controversas como eram o livre-cambismo versus protecionismo nacionalista ou o entrechoque entre o lucro e os interesses sociais da produção. Foi, igualmente, nesta edição, que Forjaz de Sampaio desenvolveu de forma mais estruturada as suas preocupações com a questão social, incorporando no seu pensamento os contributos de autores alemães como Karl Krause e Ahrens, onde foi fundamentar uma abordagem que procurou enquadrar o económico no campo de atuação político-jurídico, lançando assim uma ponte entre problemas sociais e filosofia económico-política, entre direito e economia, em suma, trazendo as questões económicas para o âmbito ainda recente do direito social.

O ensino da estatística ou estadística

Em 1841, como complemento ao compêndio de economia política, Forjaz de Sampaio publicou uns Primeiros Elementos de Ciência da Estatística (5). O sucesso obtido pela obra levou à publicação de uma tradução castelhana (6), que, durante alguns anos, constituiu o único compêndio de estatística existente em Espanha.

O desenvolvimento do ensino da estatística refletiu-se na estruturação e organização do manual, que, a partir da terceira edição (1845), se passou a designar Elementos de Economia Política e Estadística. Ainda que o estudo desta disciplina não saísse do domínio da estatística descritiva, a sua exposição pautava-se por um elevado sentido de rigor científico, que levaria, inclusive, Forjaz de Sampaio a aflorar, na última edição do seu compêndio, as vantagens da utilização do cálculo das probabilidades na previsão dos problemas económicos.

Os últimos dias do lente coimbrão

Adrião Pereira Forjaz de Sampaio faleceu em 1874. À sua morte deixou por concluir um projeto, que, nos últimos tempos, consumira parte do seu quotidiano: a criação de um curso de economia para as classes laboriosas, cujo regulamento e plano de estudos chegou a elaborar e a publicar em anexo à sebenta litografada de 1874. Acreditava o lente coimbrão que um bom plano de educação para as classes laboriosas seria fundamental para a transformação de práticas socias e económicas anquilosadas e tradicionais, que constituíam um obstáculo ao progresso.

No discurso que rematou a cerimónia fúnebre, Manuel Nunes Geraldes, que lhe sucedeu à frente da cadeira de economia política afirmou: “Morreu um homem, que dedicou a sua vida ao ensino e à universidade. Um homem que a História recordará como alguém que fez nascer no ensino superior um saber avançado, que muita falta fazia aos académicos” (7).

(1) Pereira, Esteves Rodrigues, Guilherme. 1912). “Sampaio, Adrião Pereira Forjaz de”, in Portugal, Dicionário Histórico, Corográfico, Biográfico, Heráldico, Numismático e Artístico, vol.VI, pp. 519-520. Lisboa, João Romano Torres & Cª Editores.

(2) Instituída pelo Decreto-Lei de 5 de dezembro de 1836, que extinguiu as Faculdades de Leis e Cânones, criando em seu lugar a Faculdade de Direito.

(3) Rau, Karl Heinrich. 1839. Traité d’ Économie Politique par K. H. Rau. Traduit de l’ allemand sur la trosième e dernière édition par Fréderic de Kemeter. Bruxelles, Hauman et Cie.

(4) Sampaio, Adrião Pereira Forjaz de. 1874. Elementos de Economia Política e Estadística. Coimbra, Imprensa da Universidade.

(5) Sampaio, Adrião Pereira Forjaz de. 18941. Primeiros Elementos da Ciência da Estatística. Extraídos do Jornal dos Trabalhos da Sociedade Francesa de Estatística Universal para auxílio das preleções suplementares ao curso de Economia Política na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Coimbra, Imprensa da Universidade.

(6) Sampaio, Adrião Pereira Forjaz de. 1841. Elementos de la Ciencia de la Estadistica por A. P.F F. de Sampaio, socio de la Academia de Ciencias de Lisboa, traducidas al castellano por Dom Vicente Dias Canseco, Madrid, Ignacio Roix Editor.

(7) Geraldes, Manuel Nunes. 1874. Elogio a um homem bom. Coimbra, Imprensa da Universidade.

(*) Investigador do Laboratório de História, Territórios e Comunidades (NOVA – FCSH). Diretor de edição da obra Sampaio, Adrião Pereira Forjaz de. 1995. Estudos e Elementos de Economia Política. Coleção Obras Clássicas do Pensamento Económico Português. Lisboa, Banco de Portugal. Este artigo foi escrito no âmbito da parceria entre o Laboratório de História, Territórios e Comunidades – CFE NOVA FCSH e o Jornalíssimo, com coordenação de Maria Fernanda Rollo.

Foto de abertura:
Foto de Forjaz de Sampaio (arquivo pessoal do investigador) sobre fundo rosa da Vecteezy

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