“Por favor, deixem os vossos telemóveis ligados”
E se num concerto te pedissem para fazeres sons com o teu ‘smartphone’?
Ao escreverem uma música, os compositores poderão em breve pensar num instrumento… que não é um instrumento e em músicos… que não são músicos. Confuso? Um pouco. Nós explicamos.
O INESC TEC (Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência) quis provar que os ‘smartphones’ não têm necessariamente que promover o isolamento social e constituir-se como entrave a experiências sociais coletivas.
Na realidade, o objetivo do INESC TEC era refutar tal ideia, mostrando que, pelo contrário, os telemóveis até podem acrescentar algo de novo a um concerto.
Quem se lembrou deste original formato de concerto foi o compositor e professor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto Rui Penha. Foi ele quem viu as potencialidades dos ‘smartphones’ para “aproximar o público dos intérpretes”.
Ainda confuso? Nós continuamos a explicar.
Imagina que, para um concerto específico, é desenvolvida uma aplicação para ‘smartphones’. Tu, como elemento do público, és convidado a descarregar a ‘App’ no teu telemóvel, a ligares-te a uma rede específica e a leres o ‘QR Code’ indicado no teu assento.
A partir daí, esquece que tens na mão um telemóvel. O teu ‘smartphone’ entra noutra dimensão e transforma-se num instrumento musical. Mas não penses que vais apenas carregar num botão e algo toca. És convidado a ter um papel ativo no concerto, a dar o teu contributo sonoro à música que está a ser tocada e a juntar-te, assim, aos músicos profissionais, que tocam instrumentos convencionais no cimo do palco, e claro a todos os outros elementos do público.
Tu… tocas no ecrã do telemóvel e produzes uma determinada sequência de notas, ou abanas o aparelho e emites um som contínuo, ou decides notas e ritmos dentro dos que estão programados. E escolhes o momento. São exemplos.
A interação nem é só sonora. Pode ser visual, com cada telemóvel a ser a peça de um puzzle e todos os ‘smartphones’ do público em conjunto a formarem um padrão visual. “Como se cada telemóvel fosse um pixel de uma imagem”, ajuda Rui Penha.
O compositor conta que, quando partilhou a ideia com os especialistas em redes, estes não acharam que fosse possível. Mas convenceu-os e acabou a trabalhar com os maiores craques em redes portugueses para explorar a capacidade multimédia dos aparelhos na promoção de concertos tecnologicamente interativos.
O primeiro concerto, que acabou por ser também o primeiro grande teste à ideia, aconteceu na segunda-feira passada, na Casa da Música, no Porto. Quase mil pessoas pagaram bilhete para participar nesta experiência, inovadora a nível mundial.
Rui Penha delirou: “Não estávamos a contar com tanta excitação por parte das pessoas, estavam em êxtase, contagiavam-se umas às outras. Às vezes o público era tão efusivo que abafava a música”, disse ao JORNALÍSSIMO.
“Mas não foi caótico?”, perguntámos. “O caos estava previsto, foi integrado no discurso musical”. O que aconteceu leva Rui Penha e a restante equipa a ter uma certeza: “Temos muito caminho a percorrer para explorar o potencial artístico do meio, mas ficou comprovado que esse potencial existe e é muito grande”.
O próximo concerto com esta tecnologia vai ser em Boston, nos Estados Unidos, em março. A equipa já tem acordada outra atuação em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, falta apenas definir a data.
Deixamos-te com um cheirinho do concerto de segunda-feira passada, em que foram interpretadas obras de Carlos Guedes, José Alberto Gomes, Neil Leonard e Rui Penha, interpretadas por André Dias (na percussão), Gilberto Bernardes (no saxofone) e pela ‘Digitópia Collective’ (a plataforma artística da Casa da Música reservada à criação musical em suporte tecnológico).