Maquinaria para perfurar botões na fàbrica Gròber, em Girona (Espanha) | Foto: Câmara Municipal de Girona /Public Domain

Da Revolução Industrial à industrialização portuguesa

Uma viagem em torno da indústria, da Inglaterra do século XVIII ao Portugal do século XX.

Por Ana Carina Azevedo | HTC – NOVA FCSH / CFE-UC (*)

Na segunda metade do século XVIII deu-se uma transformação nos processos de produção que viria a ser designada por Revolução Industrial. Esta transformação teve início no setor têxtil britânico, no qual foram introduzidos novos maquinismos, decorrentes da utilização da máquina a vapor. Estes permitiram a produção de artigos que, anteriormente, eram feitos de forma exclusivamente manual ou somente com o recurso a pequenas máquinas. Assim, paralelamente às pequenas oficinas e manufaturas, começam a surgir fábricas de maior dimensão que permitiam acomodar os novos maquinismos e concentrar um maior número de trabalhadores.

A Revolução Industrial impulsionou o crescimento económico, permitindo aumentar e embaratecer a produção industrial. Mas implicou, também, mudanças na estrutura social da época. A população ativa na indústria aumentou, desenvolvendo-se um novo grupo social – os assalariados. O desenvolvimento das fábricas acolhe uma mão-de-obra que abandona as zonas rurais e se concentra nas cidades, fazendo com que estas cresçam de forma rápida e, muitas vezes, desordenada. Em redor das fábricas ou nas periferias das cidades desenvolvem-se bairros operários, nos quais as condições de vida e de saúde podiam ser bastante reduzidas. Nas fábricas as condições de vida não eram melhores, com os longos horários de trabalho e a crescente utilização de mão-de-obra feminina e infantil. Nesta nova realidade quebram-se, também, as redes de apoio social baseadas nas relações familiares e de vizinhança que, anteriormente, auxiliavam os trabalhadores em caso de doença, incapacidade ou desemprego.

A Revolução Industrial também modificou as estruturas de trabalho no interior das fábricas, reduzindo o conhecimento do trabalhador relativamente à totalidade do processo de produção. Com a maior divisão do trabalho, cada operário passa a conhecer somente uma etapa do processo de fabrico. Um processo cada vez mais compartimentado, vigiado e racionalizado de modo a melhorar a produtividade do trabalho.

O desenvolvimento industrial em Portugal

Apesar de ter tido início na Grã-Bretanha, este processo expande-se para outras zonas, como a Europa continental ou a América do Norte. Simultaneamente, a partir de meados do século XIX, tem lugar um novo conjunto de alterações no setor industrial, baseadas na utilização de novos recursos energéticos, como o petróleo e a energia elétrica. Dá-se, também, uma diversificação de setores industriais, com o desenvolvimento da indústria química e siderúrgica.

O movimento de desenvolvimento industrial chega também a Portugal, apesar de evidenciar algum atraso. Apenas em meados do século XIX a máquina de vapor é difundida no país, numa altura em que a maioria das fábricas e manufaturas tinham menos de 10 operários. O desenvolvimento industrial era um dos objetivos do Fontismo e, de facto, as décadas de 1870 e 1880 marcam o primeiro surto de crescimento industrial, com a produção em fábrica a representar mais de 50% do total, em 1881. Este arranque industrial surge como reação ao aumento da procura interna e é maioritariamente dirigido ao mercado nacional. Além disso, com exceção das cortiças e têxteis, desenvolvem-se sobretudo indústrias tradicionais e pouco competitivas. Na década de 1890 dá-se um novo surto industrial, impulsionado pela necessidade de substituir importações e pela adoção de uma pauta protecionista.

O impulso das guerras no processo de industrialização

No início da I República, apesar da indústria ainda ocupar uma percentagem pequena da população ativa e do tecido produtivo ser dominado por pequenas oficinas, dá-se um crescimento de setores virados para a exportação, como as conservas, que se desenvolvem bastante durante a I Guerra Mundial. Dá-se, também, o desenvolvimento de outras indústrias, como a química – muito ligada à Companhia União Fabril (CUF) –, o vidro ou o cimento. Mas, de um modo geral, a indústria portuguesa na primeira metade do século XX continuou a ser caracterizada por um tecido industrial dominado por oficinas de pequena dimensão, muitas vezes geridas de forma familiar como complemento da atividade agrícola e sediadas em locais inadequados, como habitações familiares. Muitas vezes descapitalizadas, usavam tecnologia rudimentar e apresentavam baixos níveis de produção e produtividade.

O ponto de viragem surgiria após a II Guerra Mundial, quando o Estado inicia uma tentativa de industrialização que pretende aumentar a produção e, sobretudo, melhorar a produtividade. Desenvolve-se a crença de que o fomento da indústria poderia, por si só, conduzir ao desenvolvimento da economia e estrutura-se uma política industrial mais definida assente em instrumentos legais, como as leis de eletrificação nacional e de fomento e reorganização industrial.

(*) Este artigo foi escrito no âmbito da parceria entre o Laboratório de História, Territórios e Comunidades – CFE NOVA FCSH (https://htc.fcsh.unl.pt) e o Jornalíssimo, com coordenação de Maria Fernanda Rollo

Referências
Hudson, Pat, The Industrial Revolution, Londres, Edward Arnold, 1992.

Mattoso, José (dir). História de Portugal, volume 7. O Estado Novo (coord. Fernando Rosas). Lisboa: Editorial Estampa, 1994.

Reis, Jaime, “A industrialização num país de desenvolvimento lento e tardio: Portugal, 1870-1913”, Análise Social, volume XXIII (96), 1987, pp.207-227.

Imagens

Imagem 1:
Sociedad Anónima Grober – Fábrica de Gerona. Sección de Máquinas para agujerear Botones de Corozo por Desconegut. Ajuntament de Girona, Spain – Public Domain.

Imagem 2:
Technology from The Book of the Baltic, being the North of Europe Steam Company’s route to Denmark, Sweden, and Russia, Norway, Prussia, and the Hanseatic Ports, 1857. The British Library, United Kingdom – Public Domain.

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