A criatividade pôs esta casa na lista do Património Mundial da UNESCO

Data de 1924, mas parece ter sido construída ontem. Além das linhas modernas, o interior da ‘Rietveld Schröder House’, na Holanda, transforma-se por completo.

O que mais impressiona, quando se visita a mais célebre casa de Utrecht, é aquele momento em que subimos ao primeiro andar.

Encontramo-nos num quarto com duas camas e, de repente, enquanto ouvimos a voz que sai do audioguia, damos conta que o quarto cresceu. Na realidade, já não é um quarto. As paredes desapareceram e, com elas, as divisões.

Estamos num espaço amplo, numa enorme sala (é ilusão, a área do primeiro andar é de apenas 7 por 10 metros…). A luz abunda, agora vem até do teto.

O que era uma cama passou a ser um sofá, o que era uma porta (para a casa-de-banho) parece-se agora com a porta de um armário – foi rebatida, fazendo aparecer um corredor onde antes estava aquela divisão. (Vê o vídeo no final deste artigo, de onde tirámos as fotos dos interiores)

Esta casa que a UNESCO apelidou de “obra-prima da criatividade” e declarou, em 2000, Património Mundial parece um espetáculo de magia. Dá vontade de visitá-la uma e outra vez para nos apercebermos de todos os “truques” que permitem que, em poucos minutos, se transforme por completo.

O designer e arquiteto responsável pela obra (e pelo mobiliário geométrico que contém, em que as cadeiras assumem papel de destaque), marcada por uma simplicidade genial, foi Gerrit Rietveld.

Schröder, o outro apelido com que a vivenda foi batizada, pertence à senhora que a mandou construir. É justo que assim seja. Truus Schröder, assim se chamava ela, teve um papel ativo na conceção da planta.

A forma como Truus Schröder imaginava o local que queria habitar determinou o desenho. “A casa foi construída para uma pessoa em concreto e isso torna-a única”, conta Jan-Willem van Noord, o guia de 31 anos que nos orienta a visita – na verdade, mais do que falar, já que temos direito a um audioguia, ele é o responsável por ir modificando o espaço.

A senhora Schröder tinha acabado de ficar viúva, com duas filhas e um filho, quando mandou contruir esta casa, no início do século XX. Não queria continuar a habitar a mansão em que tinha vivido com o marido.

Imaginou, então, um espaço mais pequeno para viver, com rés-do-chão e primeiro andar. Este, o primeiro andar, seria a área principal da casa (ela gostava de se libertar do chão). Queria que tivesse uma grande sala de estar durante o dia, para estar perto dos filhos, mas que, à noite, proporcionasse maior privacidade a todos (com três quartos – um para as duas filhas, outro para o filho e outro para ela).

Graças a 18 painéis que dão forma a paredes de correr e deslizam encaixados em frisos metálicos no chão e no teto, o arquiteto conseguiu tornar o desejo da senhora Schröder realidade. Mas não é só essa mutação do espaço que torna a casa tão especial.

detalhes geniais, como o tubo que substitui a campainha e por onde quem está no exterior pode chamar quem está no interior da casa; a caixa do correio é transparente, bastando olhar para saber se o carteiro já passou; a cozinha tem uma abertura para o exterior pensada para a entrada das compras (foto acima) e as portas estão pintadas a negro nas zonas onde mais se colocam as mãos, para não se notar a sujidade.

A casa foi habitada até 1985, o ano em que a Senhora Schröder faleceu. Lá dentro, o visitante apercebe-se que a obra é, também, uma história de amor…

Depois de ficar viúvo, Rietveld foi viver com Schröder nesta mesma casa. Ele faleceria antes, em 1964, sem saber que a casa que projetou com vista para as terras conquistadas ao mar (os célebres ‘pólders’ holandeses) tem hoje uma autoestrada a passar à frente.

Se as imagens da casa te estão a dar uma estranha sensação de ‘déjà vu’, nós conseguimos explicar-te a razão… Muito provavelmente, as linhas verticais e horizontais, tal como o uso das cores primárias, estão a remeter-te para a obra de um holandês célebre, o pintor Piet Mondrian.

Mondrian e o autor desta casa foram contemporâneos. Um na pintura, outro no design e na arquitetura, ambos tiveram preocupação em expressar-se através da abstração e da simplicidade. Duas caraterísticas de uma corrente artística da época, o neoplasticismo.

Jan-Willem, o guia que há quatro anos e meio realiza as três únicas visitas diárias à casa (para visitá-la é preciso efetuar marcação), conta-nos que a maioria dos turistas estrangeiros vem do Japão: “os japoneses reconhecem aqui elementos das suas casas tradicionais, têm a mesma abertura ao exterior e paredes deslizantes”. A reação mais surpreendente que viu foi, contudo, a de um turista inglês: “vinha com a mulher e os filhos, ficou tão emocionado com o que estava a ver que desatou a chorar”.

Fazendo a visita, torna-se fácil compreender esta emoção arquitetónica. Talvez vendo o vídeo seguinte fiques com uma ideia da “magia” desta casa.

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